Divulgação de informação com segredo de justiça e quebra do sigilo telefônico - 1
A Segunda Turma iniciou julgamento de agravo regimental em reclamação em que se discute a ilegitimidade da quebra do sigilo telefônico de jornalista — autorizada com o objetivo de descobrir a fonte de notícias que vazaram informações protegidas por segredo de justiça — por afronta à autoridade do STF e à eficácia vinculante da decisão proferida na ADPF 130/DF (DJe de 6.11.2009). No caso, ao jornalista teria sido imputado o crime de quebra de segredo de justiça, previsto no art. 10 da Lei 9.296/1996 [“Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena: reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa”], por ter divulgado, em jornal, o conteúdo de conversas telefônicas entre pessoas investigadas pela Polícia Federal que teriam sido objeto de censura judicial. Isso teria ensejado o seu indiciamento, com a determinação judicial de ruptura de seu sigilo telefônico, com a finalidade de obter os números de eventuais linhas pertencentes ao seu CPF, bem como em nome de empresa de publicidade. O Ministro Dias Toffoli (relator) negou provimento ao agravo regimental, mas concedeu a ordem de “habeas corpus” de ofício para trancar o inquérito policial e tornar sem efeito o indiciamento do jornalista, além de ordenar o desentranhamento e a inutilização de todos os dados obtidos mediante indevido afastamento dos sigilos telefônicos, no que foi acompanhado pela Ministra Cármen Lúcia. Ressaltou que a matéria decida na ADPF 130 — recepção da Lei de Imprensa — não teria pertinência com o inquérito policial instaurado para apurar a prática do crime do art. 10 da Lei 9.296/1996, razão pela qual mantivera a decisão que negara seguimento à reclamação.
Rcl 19464/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 22.9.2015. (Rcl-19464)
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O relator, entretanto, vislumbrou a presença de flagrante constrangimento ilegal a autorizar a ordem de ofício. Destacou que jornalista, no exercício da profissão, não poderia ser sujeito ativo do crime descrito no art. 10, segunda parte, da citada lei. Frisou que, como o jornalista não teria acesso legítimo ao procedimento de interceptação telefônica e ao seu resultado, não poderia ser sujeito ativo desse crime específico. Salientou que, na quebra de segredo de justiça, seria possível distinguir duas condutas: a intrusão (quebra na modalidade violação), consistente no acesso indevido, por qualquer pessoa, ao conteúdo do procedimento de interceptação; e a divulgação, consistente na indevida revelação desse conteúdo, por quem a tivesse acesso legítimo. Na espécie, não haveria o mais tênue indício de que o jornalista tivesse concorrido para a quebra do segredo de justiça na modalidade intrusão, uma vez que os elementos de prova indicariam que ele se limitara a receber de um terceiro o material que conteria informações sobre as conversas telefônicas interceptadas judicialmente. Observou que a própria requisição da instauração de inquérito teria sido motivada exclusivamente pela publicação, ou seja, pela revelação do conteúdo do procedimento de interceptação telefônica, e não pela intrusão de dados sigilosos. Como a modalidade revelação de dados sob segredo de justiça constituiria crime próprio, que somente poderia ser praticado por quem legitimamente os detivesse ou a eles tivesse acesso, seria atípica a conduta do jornalista. Portanto, seria manifesta a falta de justa causa para a persecução penal, razão pela qual se cumpriria determinar o trancamento do inquérito policial contra ele instaurado, de modo a tornar sem efeito seu indiciamento. Ponderou, contudo, que, se o jornalista, ao invés de atuar como mero receptor passivo da informação sigilosa, tivesse concorrido, de qualquer modo, mediante ajuste, induzimento, instigação ou auxílio, para que um dos titulares do dever de sigilo o violasse, poderia, em tese, praticar o crime em questão, haja vista que o tipo penal admitiria participação. De toda sorte, não obstante a liberdade de informação jornalística cumprisse relevantes funções, não legitimaria a obtenção, por meios ilícitos, de informações sigilosas nem imunizaria jornalistas contra a prática de crimes no exercício da profissão. Consignou que, nas condições já retratadas, a investigação criminal encontraria limite constitucional intransponível no sigilo de fonte (CF, art. 5º, XIV), que não poderia ser violado direta ou obliquamente. Assim, deveria ser reconhecida a ilicitude de toda prova obtida mediante o afastamento do sigilo de dados telefônicos do jornalista e da empresa de publicidade, com sua consequente inutilização. O Ministro Teori Zavascki acompanhou o relator para negar provimento ao agravo regimental, todavia, divergiu quanto à concessão da ordem de “habeas corpus” de ofício. Pontuou que a cognição seria muito restrita no âmbito da reclamação, o que dificultaria o exame dos fatos em sua inteireza. Em seguida, pediu vista o Ministro Gilmar Mendes.
Rcl 19464/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 22.9.2015. (Rcl-19464)
Decisão publicada no Informativo 800 do STF - 2015
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